Episódio V: O primeiro guerreiro, conhecido em suas delimitações territoriais como Abedias, tal como James Bond, se põe a investigar o traiçoeiro território de sua missão. A curiosidade e perfeccionismo sempre foram marcas fortes desse afoito rapaz. Desde o dia em que Abedias fora abandonado por ter nascido com terríveis deformações na orelha e anormal ímpeto alimentício até os dias de então, o jovem garoto passou por um processo de desenvolvimento da sagacidade necessária para se esgueirar de tudo e todos sem deixar a mínima suspeita. É sabido que no dia em que Abedias se viu sozinho na selva taitiana ele soube intuitivamente que teria que sobreviver por suas próprias mãos. Quando fora encontrado, dezesseis anos depois, pela dita civilização, já havia desenvolvido hábitos peculiares, tais como, tais como... Bem, você verá.
Ao ser requisitado para a missão, Abedias já não era mais chamado assim. Seus descobridores o apelidaram de Prolixidade Cognitiva, pois era a única coisa que o então dito selvagem sabia pronunciar, e por sinal, o fazia incessantemente. Prolixidade Cognitiva fora treinado então por ninjas franco-sioneses da Sibéria e aprendeu as mais altas técnicas de miserabilidade (no sentido lisonjeiro dessa palavra) conhecidas na época. Ganhou o título de cidadão secreto neozelandês, o que selou definitivamente sua passagem do estado de selvageria para o estágio de homem civilizado (embora ainda fosse refém de instintos misteriosos e adormecidos, mas quem não é?). E o que isso significa?
Momento exageradamente (minto) personalista do texto: Bem, de acordo com os textos indicados pelo mestre Samuca Life, principalmente o de "Sociedade contra o Estado" de Pierre Clastres, há fortes indícios de que termos como "selvagens" e "sociedades primitivas" sejam apenas mais uma arma de dominação nossa (se é que eu faço parte da civilização ocidental, talvez já tenha aprontado o suficiente para ser banido dela, não que eu anseie por isso, mas vai saber...). Bem (é, de novo), as discussões a respeito do etnocentrismo, terminologias como instrumento de dominação, língua e poder, multiculturalismo ou mesmo relativismo cultural {termo quase sempre usado por críticos dos CRÍTICOS [perdoem-me a falta de imparcialidade (se é que isso existe)] num debate quase sempre inócuo e cheio de subjetividade da parte dos que se pretendem pensadores avalorativos, amantes do saber ou sabe-se lá quantos mais termos foram inventados para o auto-elogio} talvez já estejam desinteressantes, batidas mesmo. É uma mudança de pensamento muito radical, acho difícil algum dos lados transigir. Claro que não me refiro às opiniões das pessoas que (sabe-se lá o motivo) já correm só de ouvir falar de temas acadêmicos (uso esse termo sem qualquer intenção de qualificação positiva, apenas a título de especificação talvez mais adequada mesmo, pelo menos é o que eu estou tentando convencer). Refiro-me aos que gostam dessas "coisas". Mesmo eles talvez estejam fartos e acham que tudo se trata de uma questão de escolhas um tanto quanto excessivamente dogmáticas, mas necessárias à boa sobrevivência (e este fim último não é uma particularidade do pragmatismo). Ainda assim insisto. Percebe-se, por exemplo, que meu modo de escrever peculiar (pode valorar se quiser. Negativamente eu sei. Quem disse que não valoro? Eu tento me convencer disso, mas ainda não me venci) reflete traços da minha personalidade; a estruturação dos meus pensamentos ou mesmo pressupostos gerais da minha tática de dominação (a la USA). E meu senso de ordem? Um desastre, a maioria diria. Mas me defendo. Acho que é porque amo tudo um pouco demais e leio um pouco de menos (Pô cara, que lindo isso! Senti-me no Reino de Jhá ouvindo Bob Marley agora). A última parte com certeza é verdade.
Vale aqui uma menção desonrosa à minha ridícula não-preocupação com a necessidade de experiências anteriores com determinados ninhos de idiotices [sem carga negativa, nem positiva (Sim. Sou um exemplo de neutralidade axiológica na linguagem)] para se entender determinadas inutilidades que saem da minha mente. É que estou partindo do pressuposto de que este blog é um inevitável pé-no-saco (não no meu). Logo, não me preocupo em transmitir as minhas (tolas) experiências ou mesmo a conclusão preliminar que tirei delas.
Outra coisa legal de ser dita é que não me preocupo em ser plurisignficativo. Nem em não ser. Sequer em ser "nulosignificativo"... por aí vai.
Hoje vou deixar a "galera do deixa disso" vencer e admitir que não discutirei o que é um selvagem a fundo. Digo apenas que em tempos pós-modernos o bom selvagem de Rousseau deixa de existir dando lugar apenas ao bom. Pareceu uma crítica? Que nada! Nem disse que os antropólogos moderninhos fazem pseudociência. Alguns dizem isso. Não sou louco (sem carga, sem carga...). Acho até que estou mais pra eles inclusive, mas não posso deixar de notar que a acusação de submissão a uma ideologia de esquerda por parte deles pode ter sujado a límpida e honrada ciência social avalorativa (pleonasmo?) tradicional (de direita...). Bem, ao menos alguns direitistas já admitem sua condição. Mas qual o nível permitido de valoração e subjetividade em uma ciência social (ou mesmo natural, numa outra discussão mais perigosa)? Talvez algum dia eu especule sobre isso.
Então Abedias era o chamado bom? Vai depender de sua visão sobre tudo isso. Não sou o porre do Platão [grande pensador talvez (curto essa palavra, "talvez")] para indicar o correto aqui. Note que sequer abordei o tema de forma didática ou eficiente (talvez porque não tenha o que alguns chamam de "capacidade para isso"). Mania de querer ser mais que O CRÍTICO? Talvez. Estou bem light hoje inclusive. Hobbes e sua teoria sobre o homem passaram longe de mim (ainda que eu goste TALVEZ mais dele que do Rousseau). Quem sabe um dia...
Após receber o importante treinamento, Prolixidade Cognitiva estava pronto para fazer o exame final. Quando o fez, ficou provado que ele era a pessoa certa para a famigerada missão. Seu codinome (nome mesmo, tanto faz) passou a ser Ave de rapina e ele foi agraciado com o medalhão oficial da Escandinávia. Estava definido o destino do nobre guerreiro. Seus companheiros de missão não gostaram de seu codinome e preferiram chamá-lo pela alcunha de "Cocadinha". Agora lá está ele observando a casa do inimigo... Não perca o próximo capítulo.
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